Quando a Taylor Swift lançou Reputation em 2017, publicou uma revista junto com o álbum e evitou entrevistas. Em um trecho, ela meio que debochou da mania dos sites de fofoca de tentarem relacionar suas músicas com pessoas específicas, como se a inspiração por trás da música fosse tão simples quanto um teste de paternidade. Apesar disso, desde o seu primeiro álbum até o anterior ao Reputation, o 1989, a Taylor deixou pistas em suas anotações dos diários indicando claramente sobre quem algumas músicas eram.

Sete anos depois, e o novo álbum de Taylor, The Tortured Poets Department, não poderia ser mais transparente sobre seus assuntos, mencionando máquinas de escrever e tatuagens como referência ao Matty Healy, do 1975, com quem ela teve uma ficada na última primavera americana; e mencionando o parque em londres Hampstead Heath e “eterno sofrimento” para falar do ator Joe Alwyn, com quem namorou por seis anos.

Caso você não tenha percebido essas referências pela cobertura massiva da vida dela no último ano, há centenas de artigos online decifrando as referências cuidadosamente selecionadas; a faixa bônus “The Black Dog” menciona a banda de pop-punk da Pensilvânia, Starting Line, e uma rápida pesquisa no Google revela que o 1975 fez um cover dela ao vivo no ano passado. Talvez, Swift estivesse buscando a humilhação mais pública possível de seus ex-namorados; talvez seja uma admissão de derrota contra uma mídia que suga qualquer coisa que ela faça – ou uma tentativa descarada de usar a exposição garantida por esse tipo de cobertura.

A última opção parece mais provável, dado que a fofoca é o motor do pop no momento. Desde Taylor até o álbum de divórcio da Ariana Grande, Eternal Sunshine, passando por Sabrina Carpenter, Miley Cyrus e Olivia Rodrigo, os lançamentos de maior destaque estão cheios de entrelinhas que nos fazem roer as unhas – ou são as entrelinhas que os impulsiona para esse nível de exposição.

A atração pelas brigas de celebridades é óbvia – sempre foi um elemento importante no rap, especialmente agora, com muitas tretas rolando. Mas se isso realmente resulta em cultura pop duradoura é outra história. Taylor contribuiu para a ideia de que a música pop ganha apelo universal por meio de sua especificidade, mas há um limite para o quanto os detalhes podem melhorar a composição de uma música.

Quando nomes específicos como “Charlie Puth” começam a substituir a habilidade de criar narrativas emocionais e retratos complexos de relacionamentos, a música pode perder sua vitalidade. Em vez de se tornarem clássicos duradouros na carreira de um artista, essas músicas podem parecer mais expansões de sua mitologia pessoal, parecido com o que acontece no Universo Cinematográfico da Marvel – uma série de referências e gestos sem muita profundidade. É uma estratégia que permite que as superestrelas evitem a imprensa enquanto ainda mantêm o público envolvido.

A mudança de mídia física para streaming e redes sociais parece ser crucial para essa transformação. Agora, música nova é só mais uma coisa no seu feed; ela precisa ter os clickbaits chamativos dos seus concorrentes para acompanhar o ritmo.

Por que você se importa tanto com quem eu ando transando?” Ariana pergunta em “Yes, And?”, o lead single do Eternal Sunshine – repreendendo aos fãs e os provocando ao mesmo tempo. Também se deve a uma geração de estrelas pop femininas, especialmente jovens, se tornando autoras de seu próprio trabalho e assim documentando suas próprias vidas, algo muito menos comum no início dos anos 2010.

Isso é uma mudança totalmente positiva que produziu milhares de ótimos trabalhos. Mas até os compositores mais refinados ficam meio presos nessa época em que a sinceridade é vista como o suprassumo da autenticidade. Eles acabam sendo alvo dessas investigações online curiosas, que tratam a criação de músicas como se fosse um quebra-cabeça a ser montado em busca de alguma “verdade” final.

Olivia Rodrigo nunca falou abertamente sobre o que rolou por trás do seu hit de estreia, “Drivers License”, mas os fãs logo presumiram que tinha a ver com um suposto triângulo amoroso entre três jovens estrelas do Disney Channel. Ela parecia chateada com toda a atenção invasiva; e o mesmo rolou com Joshua Bassett, o cara que supostamente estava no meio da história, que acabou até indo parar no hospital devido ao estresse, e sua carreira nunca mais foi a mesma.

Sabrina Carpenter, que era vista como a tal “outra mulher”, escreveu a excelente música “Because I Liked a Boy”, depois de ser massacrada por causa das alegações (“Agora me chamam de destruidora de lares, me chamam de vadia… Diga quem sou eu porque eu não tenho escolha“). Depois, Sabrina pareceu meio usada nessa treta entre Olivia e Taylor, quando ela foi convidada para ser ato de abertura da The Eras Tour (e falam até que o suposto comeback de Rodrigo, “Vampire”, era sobre Taylor).

Apesar de tudo que está nas entrelinhas, o novo single da Sabrina Carpenter, “Espresso”, é uma feliz e leve distração de uma conversa séria: uma faixa disco animada sobre ser tão irresistível que mantém os meninos acordados à noite.

A música está subindo nas paradas do Reino Unido, e parece que Sabrina está prestes a se tornar a próxima grande estrela pop – um modelo em declínio, com poucas conseguindo se destacar desde Olivia Rodrigo em 2021. Você se pergunta se a dificuldade em desenvolver novas estrelas se deve à falta de uma história pronta, algo que Sabrina Carpenter tem de sobra.

Com apenas 24 anos, ela é novata para o público em geral. Começou na Disney aos 16 e já lançou cinco álbuns. Deixou até a Hollywood Records da própria Disney, que atende a um público adolescente, para assinar com a Island em 2022, ano em que lançou o Emails I Can’t Send – seu primeiro álbum após o interesse por sua vida pessoal explodir.

É uma situação complicada para o pop

Se houver muita fofoca, as músicas acabam ficando datadas. Se houver pouca, os fãs perdem o interesse. No ano passado, Ellie Goulding disse que seu quinto álbum, Higher Than Heaven, foi o “menos pessoal até agora” – e acabou sendo o menos bem-sucedido, saindo das paradas do Reino Unido após apenas duas semanas.

A primeira faixa do novo álbum de Justin Timberlake, Everything I Thought It Was, sugeriu uma reflexão após sua fase pós-Britney, mas ofereceu apenas um pop disco vazio e libidinoso: também saiu do Top 100 depois de duas semanas.

O último álbum de Kacey Musgraves, Deeper Well, trocou frustrantemente sua antiga especificidade lírica por platitudes terapêuticas. O próximo álbum de Dua Lipa tem se destacado por ter uma campanha de imprensa notavelmente vazia: legal da parte dela não abrir a vida para manchetes, mas suas entrevistas sem graça e os três singles totalmente impessoais deixaram os fãs meio desanimados com o Radical Optimism.

“O eu é o único assunto”, disse Neil Tennant dos Pet Shop Boys – um dos grandes contadores de histórias do pop, em um evento do Guardian Live esta semana, enquanto promovia o novo álbum da banda, Nonetheless. O projeto, em vez disso, inventa como seria por dentro da cabeça do dançarino Rudolf Nureyev, do espião George Blake e de Oscar Wilde.

O pop de hoje, que só fala de si mesmo, pode acabar afastando aquele fã casual que só quer uma trilha sonora para uma viagem de carro. Talvez seja por isso que as paradas estão vendo um retorno de artistas como Benson Boone, Teddy Swims, Hozier e Noah Kahan, com aquela vibe mais raiz e abrangente; e por que “Unwritten” da Natasha Bedingfield ainda está fazendo sucesso, especialmente após o sucesso em Saltburn (“Ninguém mais pode falar as palavras em seus lábios”).

Tem também uma novata que está fazendo sucesso, Chappell Roan, a estrela pop alternativa dos Estados Unidos, cuja música “Good Luck, Babe!” está bombando nas paradas. É sobre amar uma mulher que não se assume, mas acaba voltando para os homens. Mesmo assim, faz um comentário geral sobre o desejo ser imparável: “Você teria que parar o mundo só pra parar o sentimento”, ela canta.

Além disso, ela tem uma visão fantástica: uma espécie de uma rainha do rodeio do século XIX; ou a Elizabeth I com um nariz de porco. Assim como as roupas malucas do Último Jantar, este é um convite para fantasia que não requer nenhum conhecimento prévio: só se vista bem e entre na onda.

Essa vibe também é usada por Beyoncé hoje em dia: depois dos álbuns pessoais de 2013 e 2016, os mais recentes de 2022 e 2023 focam mais na música e menos na vida dela. Até por isso, a única referência a “Becky do cabelo bom” na nova versão de “Jolene” não adicionou nada de novo.

Isso não significa que as estrelas pop devam evitar escrever sobre suas vidas pessoais – muito pelo contrário. Mas o pop mais marcante navega entre os dois impulsos. O single de Charli XCX, “Von Dutch”, estava claramente provocando alguém – “tudo bem admitir que você está com ciúmes de mim” – mas quem quer que seja o alvo não se compara à forma como o ritmo ousado da música te faz sentir tão inabalável quanto Charli.

O álbum The Tortured Poets Department tem alguns momentos como assim. “Guilty As Sin?” pode deixar claro seu alvo desde a primeira linha (não é difícil adivinhar que a banda favorita do vilão pop é Blue Nile), mas a forma como Taylor descreve essa fantasia angustiante de algo proibido, enquanto está presa num relacionamento que só a sufoca, e ainda por cima nas expectativas da sociedade, é muito real. Essa vontade não realizada é o momento mais intenso e sensual do álbum – e mostra que deixar a história incompleta faz toda a diferença.

Esta é uma tradução feita pelo Conexão Pop do artigo From Taylor to Ariana, pop’s overreliance on gossip is choking the life out of it do site de notícias britânico The Guardian.

28 anos, moro no rio de janeiro e provavelmente estou na praia ouvindo alguma playlist de verão.